sábado, 26 de novembro de 2011

Sublime Paixão



Paixão
É o delírio de quem se entrega
É rebentação que carrega
É a raiz de onde brota a loucura
Paixão
É luz negra que ofusca e cega
É mar que se teme e se navega
É ânsia sublime de aventura
Paixão
É o abismo de quem se apega
É a bendita flor que o mal rega
É o reverso que tem toda jura
Paixão
É a surpresa que a gente não nega
É o destino de quem não sossega
É o mistério entre a espera e a procura
Paixão
Estranha doutrina de fé que não se prega
Estranho prazer imortal imortal que nunca dura
Paixão
É um trem que entristece e que alegra
Momento em que o amor quebra a regra
No coração de toda criatura.

Paulo César Pinheiro

sábado, 19 de novembro de 2011

Drummond

Além da Terra, Além do Céu
Além da terra, além do céu
no trampolim do sem-fim das estrelas,
no rastros dos astros,
na magnólia das nebulosas.
Além, muito além do sistema solar
até onde alcançam o pensamento e o coração,
vamos!
vamos conjugar
o verbo fudamental essencial
o verbo transcendente, acima das gramáticas
e do medo e da moeda e da política,
o verbo sempreamar
o verbo pluriamar,
razão de ser e viver.

Carlos Drummond de Andrade

terça-feira, 15 de novembro de 2011

A funçao da arte 1


Diego não conhecia o mar. O pai, Santiago Kovadloff, levou-o para que descobrisse o mar.

Viajaram para o Sul.

Ele, o mar, estava do outro lado das dunas altas, esperando.

Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas de areia, depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos. E foi tanta a imensidão do mar, e tanto fulgor, que o menino ficou mudo de beleza.

E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando, pediu ao pai:

- Me ajuda a olhar?

                        Eduardo Galeano em: O Livro dos Abraços

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Gente curiosa


Soledad, de cinco anos, filha de Juanita Fernández:
- Por que os cachorros não comem sobremesa?

Vera, de seis anos, filha de Elsa Villagra:
- Aonde a noite dorme? Dorme aqui, debaixo da cama?

Luís, de sete anos, filho de Francisca Bermúdez:
- Deus vai ficar irritado se eu não acreditar nele? Nem sei como contar isso para ele.

Marcos, de nove anos, filho de Sílvia Awad:
- Se Deus se fez sozinho, como é que conseguiu fazer as costas?

Carlitos, de quarenta anos, filho de Maria Scaglione:
- Mamãe, com quantos anos você me desmamou? Minha psicóloga quer saber.

              Eduardo Galeano em: Boca do Tempo

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Meu mundo é hoje

Uma obra-prima de Wilson Baptista,  na voz do mestre Paulinho da Viola.



Sobre Wilson Baptista, um projeto primoroso: http://osambacariocadewilsonbaptista.blogspot.com/

domingo, 6 de novembro de 2011

O Samba Carioca de Wilson Baptista

Certa vez, ouvi Ferreira Gullar dizer que a vida seria a mesmice pontuada de pequenos momentos de maravilha. Estou sob o efeito do mais intenso maravilhamento, desde que me caiu às mãos o cd "O Samba Carioca de Wilson Baptista."
Corrige-se uma injustiça histórica com um dos maiores sambistas de todos os tempos, tao genial quanto Noel, mas que, ao contrário deste, morreu no ostracismo. Morreu também na memória nacional.
Sao dois discos igualmente deleitosos. O primeiro com vinte composiçoes de músicas raras, inéditas ou jamais regravadas, que ganham vida nas interpretaçoes de vários artistas como Elza Soares, Zélia Duncan, Cristina Buarque, Mart`ália, Rosa Passos, Teresa Cristina, Marcos Sacramento, Wilson das Neves, Tantinho da Mangueira e outros. Um resgate da história do compositor da irretocável crônica social, dos personagens marginalizados e da poesia popular.
O segundo é a trilha sonora do espetáculo musical sobre a vida e obra do sambista. As mais conhecidas composiçoes, com direito a textos narrados por Cláudia Ventura e Rodrigo Alzuguir, este idealizador do projeto e grande pesquisador. Um passeio pela história pessoal de Wilson, desde que saiu de Campos dos Goytacazes e chegou adolescente ao Rio de Janeiro, fugido num cargueiro de gado, todo lambido de vaca, para enriquecer o samba carioca.
Também nao sáo esquecidas suas desavenças em músicas e versos com Noel. O roteiro segue a ordem cronológica das composiçoes de ambos, de modo que participamos da deliciosa briga tal qual ela se deu, até o apaziguamento selado com uma parceria e tudo acabar em samba, como deve ser.
O Samba Carioca de Wilson Baptista já entrou na minha lista de discos preferidos.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Antônio Cícero


Guardar

Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.
Em cofre não se guarda coisa alguma.
Em cofre perde-se a coisa à vista.
Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por
admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.
Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por
ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela,
isto é, estar por ela ou ser por ela.
Por isso melhor se guarda o vôo de um pássaro
Do que um pássaro sem vôos

.Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica,
por isso se declara e declama um poema:
Para guardá-lo:

Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda:
Guarde o que quer que guarda um poema:
Por isso o lance do poema:
Por guarda-se o que se quer guardar.

         Antônio Cícero

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Desgarrados

Não me canso de exaltar a diversidade da nossa arte!
Ventos que vem do sul sopram por aqui trazendo a beleza e o vigor da música gaúcha.