domingo, 31 de julho de 2011

Rubem Braga

É bem verdade que ostentaçao nao é nada nobre. Já decorei como mantra que a gente é o que é, nao o que tem..mas confesso que alguns apegos materiais estão entranhados em mim. Livros autografados, por exemplo. Aproveito o ensejo para avisar aos navegantes, e assim evitar eventuais constrangimentos que, dada a esta minha fraqueza, eles náo estão disponíveis para empréstimo.
Náo há nada que me envaidece mais do que meus livros autografados. Minha loucura se manifesta não só no apreço à dedicatória, uma simples assinatura já me deixa feliz. Feita de modo mecânico e repetitivo numa mesa de autógrafos, mas todas minhas, todas dando pessoalidade ao livro, que passa a ser único e personalíssimo. Coleciono algumas: Paulo Freire, Thiago de Mello, Elisa Lucinda, Nélida Piñon, Afonso Romano de Sant'anna..
Por acaso descobri na estante uma assinatura preciosa, uma relíquia que me deixou eufórica, a ponto de vir aqui compartilhar esse orgulho pessoal. Ao reler um livro de crônicas do Rubem Braga, comprado há algum tempo numa feira de livros ou num sebo (nao me recordo ao certo), deparei com uma dedicatória do cronista maior datada de dezembro de 1977. Já conferi na net, é do próprio! Por via das dúvidas, vou omitir o nome do destinatário da dedicatória...vá que ele apareça para reivindicar o prêmio? Consta do meu livrinho já puído e amarelado: "Ao fulano, com um abraço do Rubem. Feliz 1978! Rio, dez. 77."
Foi para o fulano porque náo houve tempo hábil para que fosse dedicado a mim. Nao importa. É do Rubem Braga, meu ídolo, meu cronista maior, meu poeta em prosa. Especialista em passarinhos, Cachoeiro, céu, mar, mato, elefante, bichos em geral, alma, gente e em nada. Sim, o danado não foi superado na arte de escrever sobre o nada, ou melhor, partir do nada e chegar ao mais profundo onde um texto pode ir. Numa das crônicas mais lindas que conheço, "Lembrança de um Braço Direito", ele relata o momento no qual o avião em que viajava passava por uma forte turbulência. De repente, tomado pelo medo, enxerga o braço da passageira ao lado. Pronto, o suficiente para lhe restituir a vida.
É como disse o Chico: "os poetas como os cegos podem ver na escuridão."
Rubem Braga não só vê, como irradia luz em crônicas de uma vida inteira.
E sigo exaltando a sua arte e ostentando meu livro autografado pelo Rubem! 

sábado, 30 de julho de 2011

Os Filhos de João, O Admirável Mundo Novo Baiano

Os filhos de João é um agradável convite a adentrar no sítio onde aqueles jovens insistiam num mundo diferente e acompanhar seu o amadurecimento musical, influenciado por Joáo Gilberto.
De seu modo peculiar, Tom Zé vai narrando em depoimentos a evoluçao artística dos novinhos baianos. A este somam-se os depoimentos dos participantes do grupo, com exceçao da Baby Consuelo, que, lamentavalmente, se negou autorizar a exibiçao da sua entrevista.
E ouvindo o que o mestre Joao dizia, eles foram trocando os acordes distorcidos das guitarras pelo acordes melódicos do cavaquinho; foram descobrindo que Assis Valente existia, cada vez mais olhando para a musicalidade de sua gente. Bebendo na água da música popular brasileira, criaram algo realmente original e criativo.
É um filme sensível, simples e naturalmente engraçado. Sao muitos "causos" para contar daquela experiência de vida em comunidade, filosofia hippie e uma ingenuidade que deixou saudade.

 

Mais do que a história musical dos Novos Baianos, o espectador encontrará, num segundo plano, a história de uma época. Em tempos de celebridades meteóricas, de gente vendendo o corpo, a alma e a dignidade por quinze minutos de fama, em tempos de individualismo exarcerbado, conviver por algumas horas com um grupo de jovens que desdenhava a fama e praticava uma experiência de vida coletiva é uma viagem fantástica.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Serena

Você e eu não temos mais amarras pra nos
segurar no cais
Mas você quer o seu navio longe de todo mar bravio
Só que eu prefiro o mar
E acho até que já parei tempo demais, pois quero
é navegar
Por isso é que você e eu nao temos mais
As rotas de navegação iguais
Você só quer estar por perto dos portos de
caminho certo
Mas o meu destino é o mar aberto
Dispenso os litorais, nem quero olhar prá trás.

Você é diferente, só gosta das praias e areais
Eu quero o mar corrente que nem sei prá onde me
leva
Eu quero ver a treva, eu quero o abismo
Eu quero o cataclismo, eu quero os temporais
Não sei ficar assim como quem chega ao fim
Como âncora jogada ao fundo
Contemplando o mundo sem saber dos ventos
Sem saber nem mesmo os pontos cardeais
Não quero ter apenas o seu mar de água serena
Eu quero muito mais
Os maremotos, os rodamoinhos e os vendavais
Porque a bem da verdade
É só na tempestade que eu me sinto em paz.

Paulo César Pinheiro/Pedro Amorim


quarta-feira, 27 de julho de 2011

Entrevista com Machado de Assis

São trechos de um programa de televisão em que Machado de Assis é entrevistado 50 anos depois de sua morte. Suas respostas são frases que ele mesmo escreveu em crônicas, contas ou romances.

_______________

- O senhor gostava muito de jogar xadrez com o maestro Artur Napoleão, não é verdade?

O xadrez, um jogo delicioso, por Deus! Imaginem da anarquia, onde a rainha come o peão, o peão come o bispo, o bispo come o cavalo, o cavalo come a rainha, e todos comem a todos. Graciosa anarquia ...

- Por falar em comer, é verdade que o senhor era vegetariano?

Eu era carnívoro por educação e vegetariano por princípio. Criaram-me a carne, mais carne, ainda carne, sempre carne. Quando cheguei à idade da razão e organizei o meu código de princípios, incluí nele o vegetarianismo; mas era tarde para a execução. Fiquei carnívoro.

- Que tal acha o nome da Capital de Minas?

Eu, se fosse Minas, mudava-lhe a denominação. Belo Horizonte parece antes uma exclamação que um nome.

- E a respeito da ingratidão?

Não te irrites se te pagarem mal um benefício; antes cair das nuvens que de um terceiro andar.

- E a imprensa de escândalo?

O maior pecado, depois do pecado, é a publicação do pecado.

- E esses camaradas que estão sempre na oposição?

O homem, uma vez criado, desobedeceu logo ao Criador, que aliás lhe dera um paraíso para viver; mas não há paraíso que valha o gosto da oposição.

- E o trabalho?

O trabalho é honesto, mas há outras ocupações pouco menos honestas e muito mais lucrativas.

- E a herança?

Há dessas lutas terríveis na alma de um homem. Não, ninguém sabe o que se passa no interior de um sobrinho, tendo de chorar a morte de um tio e receber-lhe a herança. Oh, contraste maldito! Aparentemente tudo se recomporia, desistindo o sobrinho do dinheiro herdado; ah! mas então seria chorar duas coisas: o tio e o dinheiro.

- E a loteria?

Loteria é mulher, pode acabar cedendo um dia.

- O senhor já ouviu falar da cantora Leny Eversong?

Quando eu era moço e andava pela Europa, ouvi dizer de certa cantora que era um elefante que engolira um rouxinol.

- E sobre as dívidas?

Que é pagar uma dívida? É suprimir, sem necessidade urgente, a prova do crédito que um homem merece. Aumentá-la é fazer crescer a prova.

- Pode me dar uma boa definição do amor?

A melhor definição do amor não vale um beijo de moça namorada.

- E as brigas de galos?

A briga de galos é o Jockey Club dos pobres.

- O amor dura muito?

Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis; nada menos.

- E a honestidade?

Se achares três mil-réis, leva-os à polícia; se achares três contos, leva-os a um banco.

- E o Brasil?

O país real, esse é bom, revela os melhores instintos; mas o país oficial, esse é caricato e burlesco."

- E o sono?

Dormir é um modo interino de morrer.

- E os filhos?

Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria.

- Muito obrigado, o senhor é muito franco em suas respostas.

A franqueza é a primeira virtude de um defunto.


- De qualquer modo, desculpe por have-lo incomodado. Mas é que neste programa sempre entrevistamos alguém que já morreu ...

Há tanta coisa gaiata por esse mundo que não vale a pena ir ao outro arrancar de lá os que dormem ... "


Rubem Braga in: A Cidade e a Roça

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Selinho


Um regalo gracioso da querida Edinha. Gracias, Edinha. bjs. Sucesso!
Regrinhas para repassá-lo:
Postar o link do blog que premiou:http://geraniosnajanela.blogspot.com/.
Publicar as regras;
4. Indicar 10 blogs para receberem:
5. Avisar os indicados.

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Beatriz





Beatriz,
Veja só que privilégio: esta é apenas uma das inúmeras versões de uma das canções mais lindas do nosso cancioneiro. É toda sua, Beatriz!
Tomara que a música te pegue de jeito. Tomara que os livros te peguem de jeito. Tomara que a arte te constitua. Tomara que a vida, como a sua canção, venha nos mais diversos tons e versões, todos arrebatadores!
Beijos da tia.

quarta-feira, 20 de julho de 2011


O mestre Paulo César Pinheiro desfilando na passarela do meu bloguinho..
 "Arco do Tempo" é a canção que dá nome ao cd primoroso da Soraya Ravenle.
Arco do Tempo(Paulo César Pinheiro)
Eu tenho um barco por dentro
Seu rumo é a curva de um arco
Seguindo o arco do tempo
Que puxa a corda do barco

O barco é o meu sentimento
No mar do peito eu me encharco
Em qualquer ponto do tempo
Eu passo e finco meu marco

Meu rastro é o verso que eu deixo
Formando um mar de sargaço
E quanto mais mar eu vejo
É mais um canto que eu faço

Já fiz um círculo e tanto
Cruzei um século inteiro
Morrer eu vou, mas meu canto
Jamais vai ter paradeiro

segunda-feira, 18 de julho de 2011

O rio

Ser como o rio que deflui
Silencioso dentro da noite.
Não temer as trevas da noite.
Se há estrelas nos céus, refleti-las.
E se os céus se pejam de nuvens,
Como o rio as nuvens são água,
Refleti-las também sem mágoa
Nas profundidades tranqüilas.

                     Manuel Bandeira

domingo, 17 de julho de 2011

As nuvens


Sinto vontade de dizer que elas já são de casa. Só não digo porque algum leitor pode achar que é invenção de poeta, por ainda não saber que a poesia é a essência da verdade. De resto, eu nada invento. Digo só a verdade das coisas. Mas as minhas nuvens são como se já fossem de casa. Pois chegam todos os dias. Chegam de manhã, chegam pelo entardecer. Solenes e cheias de luz, gostam de passar bem defronte de casa. Encostado ao para-peito da varanda, perco a conta do tempo conversando com elas, ouvindo as histórias que me contam de ventos e relâmpagos, me dão notícias de águas celestes e da multidão musical de pássaros que encontram pelo caminho. Por falar nisso, há dias em que elas próprias chegam cantando, quase inaudível sussuro, esquecidas cantigas de minha infância.

Nos dias cinzentos as minhas nuvens não vêm. Desaparecem quando a noite desce. São seres que precisam de claridão. Pessoas de fé me dizem que, durante minhas ausências demoradas, elas sempre que passam, dão uma olhada saudosa para as janelas de casa, derramam um pouco de luz sobre a dança das palmeiras e das flores. Vez por outra, quando me encontram sozinho, a esperá-las, não falam nem cantam, ficam só me olhando nos olhos, querendo me descobrir o fundo do pensamento: sempre me deixam a lição de que, iguais a elas, somos seres efêmeros, por isso mesmo é preciso trabalhar na construção da beleza que perdure. Sábias e belas são as minhas amigas, as nuvens da floresta.

                              Thiago de Mello: De Uma Vez por Todas

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Lixo Extraordinário




Para quem perdeu no cinema, uma boa notícia: já chegou às locadoras o primoroso documentário "Lixo Extraordinário", do artista plástico, Vik Muniz. Um documentário que foge ao lugar-comum da exposição gratuíta da miséria para abordar um tema que me encanta: o poder transformador da arte.

Ambientado no Jardim Gramacho, o maior aterro sanitário da América Latina, localizado na baixada fluminense, relata o emocionante encontro entre o artista e os trabalhadores de material reciclado (como eles gostam de ser chamados), que muda irremediavelmente a vida de todos.

Parece que o resultado surpreende até Vik Muniz, que não imaginava até onde seu projeto chegaria. A arte é mesmo surpreendente! Ela pode chegar calma, como um regato batendo miudinho nas pedrinhas internas da gente, ajeitando-as sutilmente, ou se precipitar como uma cachoeira, arrastando todas as certezas que encontra no caminho. E foi desta forma que ela entrou na vida daquelas pessoas, transformando-as.

A arte é a grande estrela do filme, a vedete principal, responsável pelo resgate da autoestima e da transformaçao da percepção de mundo daqueles trabalhadores esquecidos no lixo. Na medida em que ela entra em suas vidas de forma mais pungente, restitui-lhes a noção de pertencimento, de modo que eles passam a se enxergar como indivíduos e como uma classe trabalhadora, sim: consciëncia de classe! Ela é formadora (até quando não pretende ser) e humanizadora. Um filme comovente!
  
  

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Ganhei mais um selinho da querida Edinha. Ela e seu blog maravilhoso! http://geraniosnajanela.blogspot.com/ bjs, querida.
Regrinhas para repassá-lo:
1. Exibir a imagem do prêmio;
2. Postar o link do blog que premiou:http://geraniosnajanela.blogspot.com/.
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5. Avisar os indicados.

 http://letraefel.blogspot.com/
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http://clarisselispector.blogspot.com/

A arte (por eles):

A arte amplia o mundo. Existe o céu, existem as estrelas e existe o céu estrelado de Van Gogh.
 Ferreira Gullar
****
A arte é uma fada que transmuta e transfigura o mau destino.
Prova. Olha. Toca. Cheira. Escuta.
Cada sentido é um dom divino.
Manoel Bandeira.
****
A arte não é um trabalho manual, ela é a transmissão de sentimento que o artista experimentou.
Leon Tolstoi
****
As grandes obras de arte somente são grandes por serem acessíveis e compreendidas por todos.
Leon Tolstoi
****
Eu não pinto as coisas como as vejo, mas sim como as penso.
Pablo Picasso
****
Os espelhos são usados para ver o rosto, a arte para ver a alma.
Bernard Shaw
****
Todas as artes contribuem para a maior de todas as artes, a arte de viver.
Bertold Brecht
****
A arte é a contemplaçao: é o prazer do espírito que penetra a natureza e descobre que ela também tem uma alma. É a missão mais sublime do home, pois é o exercício do pensamento que busca compreender o universo, e fazer com que os outros o compreendam.
Auguste Rodin
****
O fim da arte inferior é agradar, o fim da arte média é elevar, o fim da arte superior é libertar.
Fernando Pessoa

terça-feira, 12 de julho de 2011

Fantasmas da Esperança

Dedico este poema aos sindicalistas José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo, covardemente assassinados por defenderem a floresta da ganância dos madeireiros e a outros mártires que a mídia não tem interesse em vivulgar.

Deixemos Deus sossegado
e colhamos as vinhas da nossa ira.
Soem trombetas
Acordem liras
Pois não existe céu além deste que
conhecemos e poluímos.
Homens, até quando
a terra será encharcada
com o sangue dos teus irmãos?
Até quando morrerão  índios,
negros, mulheres, crianças,
bastardos e desempregados,
e uma leva de outros seres subalternizados?
Por que não conseguimos enxergar
que o rosto desfigurado
do homem e da mulher
sem nome, sem casa e com fome
é o meu e o seu rosto, é o nosso rosto?
Porque não aceitamos que
esse homem e essa mulher são, também,
a flor que arrancamos,
o animal que assassinamos
as árvores que deixamos cair...
Até quando o ferro e o fogo
calarão vozes mais esclarecidas?
E no lugar das árvores
sejam plantadas as sombras
dessas existências perdidas?
Morreu Paulo Cesar Vinha,
Chico Mendes, Maria do Espírito Santo
Dorothy, irmã querida,
morreu José Cláudio Ribeiro da Silva,
defendendo as castanheiras
e a nossa humanidade.
Tantos outros também partiram
traídos pelos seus.
Exército de vencidos
que se levantará um dia
ainda mais forte, pois,
existem coisas que não se pode matar:
a Fé, a Esperança, a Revolta, a Justiça!
Esta é a hora de nos inspirarmos
nos fantasmas da esperança, para que
as gerações futuras possam descansar, ter
ar, água, lugar de existência.
Nós nos perdemos no labirinto
da modernidade ourobórica,
construída com armas tecnológicas.
Não temos, mas, ainda buscamos,
alguém ou algo que nos salve
de nós mesmos.
                               Renata Bonfim


                                                *********

Estou eufórica com a notícia abaixo! Ansiosíssima! Para os meus conterrâneos:

gazeta online - ES
De 02 de agosto a 02 de outubro, estarão expostas no Palácio Anchieta obras originais de quatro renomados artistas espanhóis: Pablo Picasso, Salvador Dalí, Francisco Goya e Joan Miró. A exposição "Mestres Espanhóis" é inédita no país e Vitória será a primeira cidade a recebê-la.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

O Pavão


Eu considerei a glória de um pavão ostentando o esplendor de suas cores; é um luxo imperial. Mas andei lendo livros, e descobri que aquelas cores todas não existem na pena do pavão. Não há pigmentos. O que há são minúsculas bolhas d'água em que a luz se fragmenta, como em um prisma. O pavão é um arco-íris de plumas.

Eu considerei que este é o luxo do grande artista, atingir o máximo de matizes com o mínimo de elementos. De água e luz ele faz seu esplendor; seu grande mistério é a simplicidade.

Considerei, por fim, que assim é o amor, oh! minha amada; de tudo que ele suscita e esplende e estremece e delira em mim existem apenas meus olhos recebendo a luz de teu olhar. Ele me cobre de glórias e me faz magnífico.

                                Rubem Braga: "Ai de ti, Copacabana"

domingo, 10 de julho de 2011

Selinho



Recebi este selinho da estimada Edinha. Obrigada. Amei!
Olha as regrinhas para repassá-lo:

1. Exibir a imagem do prêmio;
2. Postar o link do blog que premiou:http://geraniosnajanela.blogspot.com/.Publicar as regras;
4. Indicar 10 blogs para receberem:
5. Avisar os indicados.

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Por quem os Sinos Dobram

“Nenhum homem é uma ilha, inteiramente isolado / Todo homem é um pedaço de um continente, uma parte da terra / Se um torrão de terra for levado pelas águas até o mar, a Europa fica diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse a casa de teus amigos ou a tua própria / A morte de qualquer homem me diminui, porque sou parte do gênero humano. / E por isso não perguntes por quem os sinos dobram: eles dobram por ti.”


            John Donne, poeta inglês, citado em "Por quem os Sinos Dobram", de Ernest Hemingway

sábado, 9 de julho de 2011

As Pequenas Memórias

"Eu considero que, se não somos a criança que fomos, pelo menos a criança que fomos gerou a pessoa que somos."      José Saramago
 
 
Vibro quando um escritor da minha preferência publica suas memórias, dando de bandeja a oportunidade de descobri-los humanos. Antes de serem mitos, foram crianças, como eu e como qualquer pessoa de qualquer lugar. As biografias também existem para desnudá-los, mas, por óbvio, é o olhar de outra pessoa.

E mesmo sabendo que as memórias - dos escritores e a de cada um de nós - não são assépticas, saboreio-as com avidez. Por mais que apareça a imagem nítida de um acontecimento da história da gente, ela estará impregnada de subjetividade, sendo, antes de tudo, a percepção do fato decorrido, e não necessariamente o fato tal qual se deu, o que a torna mais fascinante: o acontecimento e a imaginação, juntos e misturados.

Fascina-me também o arquivo das nossas reminicências. Seria impossível, conscientemente, armazenar todos os acontecimentos de todos os dias vividos. Entáo, por algum processo psiquico (nada é aleatório, já dizia o velho Freud) que só nos cabe compreender no divã, algumas memórias são guardadas coloridas, brilhantes e cheirando à novas, outras em preto e branco, há ainda as picotadas, as mofadas, as apagadinhas, quase irreconhecíveis.. tudo num embaralhamento misterioso, na qual as banais podem se sobrepor às heróicas, as antigas às recentes, numa lógica que foge à racionalidade.

Saramago deixou registradas suas memórias da tenra infância até a adolescência. "As Pequenas Memórias" estáo aí para quem quiser afagar a criança e o jovem Saramago, quem quiser, de mãos dadas com ele, aventurar-se pelas ruas de Lisboa e Azinhaga, na incrível descoberta dos mistérios do mundo. E sob a narrativa sensível e poética do escritor, descobrir o primeiro amor, a primeira perda (do irmáo), sofrer  suas tragédias, algumas situações dolorosas (até traumáticas), viver deliciosas traquinagens, penetrar na sua aldeia, na sua casa, nos seus afetos e ser convidado a crescer com ele.
  

quinta-feira, 7 de julho de 2011

A bênção, Vinícius de Moraes!

Amigos

Amigos que não sabem o quanto são meus amigos.
Não percebem o amor que lhes devoto e a absoluta
necessidade que tenho deles.

A amizade é um sentimento mais nobre do que o amor,
eis que permite que o objeto dela se divida em outros afetos, enquanto o
amor tem intrínseco o ciúme, que não admite a rivalidade.

E eu poderia suportar, embora não sem dor, que
tivessem morrido todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem
todos os meus amigos!

Até mesmo aqueles que não percebem o quanto são meus
amigos e o quanto minha vida depende de suas existências …

A alguns deles não procuro, basta-me saber que eles existem.
Esta mera condição me encoraja a seguir em frente pela vida.

Mas, porque não os procuro com assiduidade, não
posso lhes dizer o quanto gosto deles. Eles não iriam acreditar.

Muitos deles estão lendo esta crônica e não sabem
que estão incluídos na sagrada relação de meus amigos.
Mas é delicioso que eu saiba e sinta que os adoro,
embora não declare e não os procure.

E às vezes, quando os procuro, noto que eles não tem
noção de como me são necessários, de como são indispensáveis ao meu
equilíbrio vital, porque eles fazem parte do mundo que eu, tremulamente,
construí e se tornaram alicerces do meu encanto pela vida.

Se um deles morrer, eu ficarei torto para um lado.
Se todos eles morrerem, eu desabo!
Por isso é que, sem que eles saibam, eu rezo pela vida deles.
E me envergonho, porque essa minha prece é, em
síntese, dirigida ao meu bem estar. Ela é, talvez, fruto do meu egoísmo.

Por vezes, mergulho em pensamentos sobre alguns deles.
Quando viajo e fico diante de lugares maravilhosos,
cai-me alguma lágrima por não estarem junto de mim, compartilhando
daquele prazer …

Se alguma coisa me consome e me envelhece é que a
roda furiosa da vida não me permite ter sempre ao meu lado, morando
comigo, andando comigo, falando comigo, vivendo comigo, todos os meus
amigos, e, principalmente os que só desconfiam ou talvez nunca vão saber
que são meus amigos!
A gente não faz amigos, reconhece-os.


                                                         Vinícius de Moraes

quarta-feira, 6 de julho de 2011

A Ponta do Nariz

"(...) Sabe o leitor que o faquir gasta longas horas a olhar para a ponta do nariz, com o fim único de ver a luz celeste. Quando ele finca os olhos na ponta do nariz, perde o sentimento das coisas externas, embeleza-se no invisível, apreende o impalpável, desvincula-se da Terra, dissolve-se, eteriza-se. Essa sublimação do ser pela ponta do nariz é o fenômeno mais excelso do espírito, e a faculdade de a obter não pertence ao faquir somente: é universal. Cada homem tem necessidade e poder de contemplar o seu próprio nariz, para o fim de ver a luz celeste, e tal contemplação, cujo efeito é a subordinação do universo a um nariz somente, constitui o equilíbrio das sociedades. Se os narizes se contemplassem exclusivamente uns aos outros, o gênero humano não chegaria a durar dois séculos: extinguia-se com as primeiras tribos. (..)"


               Machado de Assis - Memórias Póstumas de Brás Cubas

terça-feira, 5 de julho de 2011

Poeta da Voz

No meu pateão de compositores, Paulo César Pinheiro tem lugar de destaque. Ele e Chico Buarque são os  melhores letrista deste país.
Nunca entendi o porquê dos intérpretes contemporâneos não emprestarem mais suas vozes à poesia do PCP. Depois que Clara Nunes se foi, sua poesia ficou com menos voz.   
Vasculhando uma loja de CDs no Rio, a Arlequim, onde se encontra de tudo, deparei-me, mais uma vez por acaso, com dois álbuns dedicados a ele: um da Selma Reis e o outro da Soraya Ravenle, A Minha Homenagem ao Poeta da Voz e Arcos do Tempo, respectivamente. Nem consultei o preço! Eram meus!
Soraya nos brinda com um passeio por canções inéditas do poeta da voz. Já Selma optou por percorrer suas canções mais conhecidas.
Resolvi que, em homenagem ao poeta da voz, sua poesia, vez por outra, virá ensolarar este bloguinho.

OFÍCIO
(Paulo César Pinheiro)


A música me ama
Ela me deixa fazê-la
A música é uma estrela
deitada na minha cama.


Ela me chega sem jeito,
quase sem eu perceber,
quando dou conta e vou ver,
ela já entrou no meu peito.


No que ela entra a alma sai,
fica o meu corpo sem vida,
volta depois comovida,
e eu nunca soube onde vai.


Meu olho dana a brilhar,
meu dedo corre o papel,
e a voz repete o cordel
que se derrama do olhar.


Quando terminho o meu canto,
depois de o bem repetir,
sinto-lhe aos poucos partir
quebrando enfim todo o encanto.


fico algum tempo perdido
até me recuperar,
quase sem acreditar
se tudo teve sentido.


A música parte e eu desperto
pro mundo cruel que aí está,
com medo de ela náo mais voltar,
mas ela está sempre por perto.


Nada que existe é mais forte,
e eu quero aprender-lhe a medida
de como compõe minha vida
que é para compor minha morte.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Roseando..

Refresca teu coração. Sofre, sofre, depressa, que é para as alegrias novas poderem vir..


Que nunca sejam triviais para mim os castanheiros.


Eu estou só. O gato está só. As árvores estão sós. Mas não é o só da solidão: é o só da solistência.


Também os defeitos dos outros são horríveis espelhos.


A queda do Homem persiste, como as cachoeiras.

Nós todos viemos do Inferno; alguns ainda estão quentes de lá.


Saudade é ser, depois de ter.


Não ter medo: o mar não se destrói com nenhuma tempestade.


Só as pessoas não morrem: tornam a ficar encantadas.


Forte é a onda - que se deixa a empuxo e vento.


Só na foz do rio é que se ouvem os murmúrios de todas as fontes.


A noite não é o fim do dia: é o começo do dia que vem.


O que seria um epitáfio: Neste tempo e lugar, repousa o amigo da harmonia.


                                          Guimarães Rosa - Ave, Palavra

domingo, 3 de julho de 2011

Agradecimento

Esta postagem será a mais pessoal até aqui, por isso a mais difícil de parir (dificílima!). Todavia, depois de ler os comentários de alguns amigos do peito e de novos leitores, não há como não dar o tom confessional a este texto. Esta é a minha maneira de agradecer o carinho e incentivo de todos.
Eu desconhecia o quanto pode ser perigoso esse negócio de liberdade de expressão. É por demais tentadora uma página em branco! A gente inicia uma postagem com a intençao apenas de recomendar, em poucas linhas, um filme legal, mas, quando vê, o texto já ganhou autonomia, já disse o que quis, à nossa revelia. Como a vida, é imprevisível! 
E, com ele, lá vou eu, me revelando (bem mais do que queria). Quando eu revisito alguma obra marcante na minha existência, eu me revisito. São novas leituras, novos olhares, novas emoções, novas bulições. Neste sentido, o ato de escrever tem me feito bem.
Não obstante, estou ficando um tanto acanhada. Por obra e graça dos amigos generosos, este bloguinho está ficando mais conhecido. E aí eu me pego preocupada com a opinião de leitores, que eu nem sei quem são, e também dos amigos (alguns eu até enrolei para apresentar este cantinho).
Para que continue a ser algo prazeroso, o desafio será deixar que os pensamentos se ordenem como quiserem - sem interferências externas - que o lá de trás pule a fila quando a necessidade for imperiosa, que o mais pueril também apareça quando lhe convier, mas, sobretudo, que todos sejam meus. 

Obrigada pela força!

Beijos a todos.